A menopausa, etapa natural na vida de toda mulher, pode ser desafiadora. Para mulheres heterossexuais, é uma fase sobre a qual há bastante informação e, muitas vezes, um certo apoio social. Porém, para mulheres lésbicas e bissexuais, a vivência da menopausa pode ser ainda mais complexa, marcada por uma confluência de silenciamento, estigmatização e uma falta de espaço para a troca de experiências sobre o tema. Como se a menopausa por si só já não fosse uma questão profundamente íntima, o fato de ser uma mulher que foge aos padrões heteronormativos impõe desafios ainda maiores.
Se o universo da saúde das mulheres já tende a ignorar ou marginalizar as especificidades de grupos que não se encaixam na cis-heteronormatividade, no caso de mulheres lésbicas e bissexuais, o cenário se torna ainda mais problemático. Falta de representação, de informação direcionada e até mesmo de suporte específico podem intensificar o sofrimento nessa fase da vida.
Neste artigo, discutiremos as particularidades que as mulheres lésbicas e bissexuais enfrentam ao lidar com a menopausa, as barreiras invisíveis que muitas vezes existem no atendimento médico, e como buscar ajuda especializada que compreenda as nuances dessa vivência. E, claro, abordaremos como a sociedade e a própria comunidade LGBTQ+ podem se tornar aliadas no processo de autocuidado e empoderamento durante a menopausa.
A Menopausa: Mais do que a Perda da Fertilidade
A menopausa é definida como o período da vida da mulher que ocorre após 12 meses consecutivos sem menstruação. Em geral, ela acontece entre os 45 e 55 anos, mas isso pode variar para cada indivíduo. A menopausa não é apenas a cessação da menstruação, mas uma série de mudanças hormonais que afetam profundamente o corpo e a mente. As ondas de calor, o ressecamento vaginal, as mudanças no sono e no humor, além de uma maior predisposição a problemas cardíacos e osteoporose, são apenas alguns dos sintomas comuns dessa fase.
No entanto, para mulheres lésbicas e bissexuais, a experiência pode ser muito mais solitária. A ausência de apoio específico e a invisibilidade de suas necessidades no contexto da menopausa agravam o impacto físico e emocional dessa etapa. Muitas dessas mulheres já enfrentam uma invisibilidade na sociedade como um todo e, ao chegar na menopausa, elas podem se sentir ainda mais marginalizadas, especialmente por não serem vistas nas narrativas tradicionais sobre o envelhecimento feminino.
O Desafio da Falta de Informação
Embora a menopausa seja um evento biológico universal, as informações sobre o tema são frequentemente voltadas para o público heterossexual, cisgênero. As campanhas e os recursos sobre saúde da mulher frequentemente não abordam as especificidades das mulheres lésbicas ou bissexuais, que podem ter preocupações diferentes ou que precisam de apoio médico especializado que compreenda sua vivência de sexualidade e identidade.
Por exemplo, muitas mulheres lésbicas e bissexuais têm menor interesse ou experiência com a contracepção tradicional, e isso pode afetar sua relação com o acompanhamento ginecológico, que, na maior parte das vezes, ainda foca no modelo heteronormativo de sexualidade. A falta de discussões inclusivas nas consultas médicas também contribui para que essas mulheres não se sintam representadas nem acolhidas durante a menopausa, o que pode resultar em um tratamento negligente ou até mesmo desinformado.
Além disso, muitas mulheres lésbicas e bissexuais têm dificuldade em procurar cuidados médicos devido ao receio de estigmatização ou de enfrentarem atitudes discriminatórias por parte de profissionais de saúde que não compreendem as especificidades de sua sexualidade. A pressão para se adequar a um modelo heteronormativo de mulher pode ser um obstáculo significativo para o acesso à saúde e ao suporte emocional.
O Impacto Psicológico e Emocional
A menopausa pode desencadear uma série de reações emocionais e psicológicas, como a sensação de perda de identidade ou de valorização social. Para muitas mulheres lésbicas e bissexuais, a menopausa pode ser um momento de reflexões sobre a sua sexualidade, sobre a mudança no corpo e até sobre a percepção da sua própria feminilidade. A sociedade muitas vezes ainda tem dificuldades em visualizar a mulher mais velha como um ser sexualmente ativo, especialmente uma mulher lésbica ou bissexual, que foge das normas convencionais.
A experiência de envelhecer, muitas vezes, é estigmatizada dentro da própria comunidade LGBTQ+, onde, em muitos espaços, há uma pressão constante para que os corpos se mantenham jovens, vibrantes e dentro de padrões estéticos impostos pela sociedade. Para as mulheres lésbicas e bissexuais, essa pressão é muitas vezes exacerbada, pois não há um campo amplo de representação que inclua a diversidade de corpos e vivências dessas mulheres.
Além disso, a menopausa pode ser acompanhada de uma maior necessidade de cuidar da saúde mental, pois os hormônios desregulados podem causar mudanças de humor, ansiedade e até mesmo sintomas depressivos. Esses sintomas podem ser intensificados pela falta de apoio, seja da família, dos amigos ou da comunidade LGBTQ+.
Buscando Apoio Especializado
Para lidar com os sintomas da menopausa, é essencial buscar profissionais que compreendam não apenas as questões físicas, mas também as questões emocionais e psicossociais. A primeira recomendação é procurar ginecologistas e endocrinologistas que ofereçam uma abordagem sensível à identidade sexual de cada mulher. No Brasil, algumas clínicas e grupos de apoio como o Grupo de Estudos sobre Sexualidade e Gênero (GESG) oferecem atendimentos especializados para mulheres LGBTQ+, proporcionando um espaço seguro para discutir questões de saúde sexual e reprodutiva.
O apoio psicológico também é fundamental. Psicólogos especializados em questões de gênero e sexualidade podem ajudar a navegar a complexidade emocional dessa fase da vida. Muitas dessas profissionais oferecem atendimento online, o que facilita o acesso e o conforto de estar em um ambiente seguro e acolhedor.
Outro recurso importante são as associações e ONGs voltadas para a comunidade LGBTQ+, como a ABGLT (Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) e a Casa 1, que oferecem orientação sobre saúde mental e bem-estar, além de eventos e grupos de apoio que discutem temas como a menopausa e envelhecimento.
Cuidando do Corpo e da Mente
Além dos cuidados médicos, é fundamental adotar uma rotina de autocuidado durante a menopausa. A prática de atividades físicas, como a caminhada, yoga ou pilates, pode ajudar a controlar os sintomas, como as ondas de calor e a ansiedade. Alimentação balanceada, rica em cálcio e vitamina D, também é importante para prevenir doenças ósseas, que podem ser uma preocupação crescente após a menopausa.
Além disso, a conexão com outras mulheres lésbicas e bissexuais pode ser uma forma poderosa de apoio emocional. Grupos de mulheres, tanto online quanto presenciais, podem proporcionar um espaço para compartilhar experiências e sentir-se compreendida.
Conclusão
Lidar com a menopausa sendo uma mulher lésbica ou bissexual pode ser um desafio, dado o contexto de invisibilidade e falta de informações direcionadas a essas vivências. A sociedade, a comunidade LGBTQ+ e os profissionais de saúde precisam ser mais inclusivos e oferecer suporte que considere as especificidades dessa experiência.
É essencial que as mulheres lésbicas e bissexuais busquem apoio e cuidado durante essa fase, tanto médico quanto emocional, e que o tema da menopausa seja abordado de forma aberta e sensível. Ao acolher as necessidades de todas as mulheres, independentemente de sua sexualidade ou identidade de gênero, a sociedade pode garantir que todas tenham o direito a uma vida saudável, plena e empoderada, em qualquer fase da vida.