Após protestos, eleição da Comissão de Direitos Humanos é cancelada

Protestos e discursos contra a indicação do deputado Pastor Marco Feliciano (PSC-SP) para o comando da Comissão de Direitos Humanos da Câmara levaram ao cancelamento da reunião desta quarta-feira (6) que elegeria o novo presidente do colegiado. A sessão teve início em meio a palavras de ordem gritadas por manifestantes que ocuparam o plenário da comissão.
Diante do impasse, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), convocou uma nova sessão para esta quinta-feira (7), na tentativa de concluir a escolha do presidente do colegiado.
Pastor da igreja Assembleia de Deus, o deputado causou polêmica em 2011, quando fez declarações polêmicas em sua conta no microblog Twitter sobre africanos e homossexuais.
“Sobre o continente africano repousa a maldição do paganismo, ocultismo, misérias, doenças oriundas de lá: ebola, Aids, fome… Etc”, escreveu o deputado na ocasião.
Ele também havia publicado na rede social que “a podridão dos sentimentos dos homoafetivos leva ao ódio, ao crime e à rejeição”.
Após o cancelamento da eleição, o líder do PSC, André Moura (SE), reuniu-se no gabinete da presidência da Câmara com Henrique Alves. Ao final do encontro a portas fechadas, o chefe da casa legislativa anunciou o agendamento de nova sessão dos Direitos Humanos para a manhã desta quinta.
Em entrevista à imprensa, Henrique Alves criticou a forma como os militantes de direitos humanos impediram a eleição do novo dirigente do colegiado.
“Os parlamentares que forem contrários podem se ausentar ou votar contra, mas não realizar o que foi realizado. A democracia exige ordem. É uma indicação que tem que ser respeitada. Assim, nós faremos amanhã [quinta], às 9h, reunião para eleger o presidente da comissão.”
O líder do PSC afirmou que a candidatura de Feliciano não será retirada para atender aos apelos dos militantes ligados à bandeira de direitos humanos. “Está mantida a candidatura do deputado Marco Feliciano. É uma decisão da bancada, do partido. Ele é de nossa inteira confiança. Ele está sendo julgado de forma antecipada. O fato de ele defender determinadas bandeiras não significa que ele, como presidente da comissão, vá trabalhar de forma tendenciosa”, enfatizou.
No momento em que Feliciano foi anunciado pelo atual presidente da Comissão de Direitos Humanos, deputado Domingos Dutra (PT-MA), como o nome escolhido pelo PSC para substituí-lo, os manifestantes começaram a vaiá-lo ao som de palavra de ordem, como “fora, fora, fora”.

Manifestantes protestam contra eleição de deputado pastor do PSC para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara (Foto: Murilo Salviano/ G1)

Manifestantes protestam contra eleição de deputado pastor do PSC para a presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara (Foto: Murilo Salviano/ G1)

Integrantes da comissão contrários à indicação do pastor discursaram para tentar convencer o PSC a escolher outro nome para o comando do colegiado.
Por acordo entre os líderes das bancadas da Câmara, a presidência dessa comissão foi entregue ao PSC na última semana. O PT, sigla que presidiu o colegiado em 2012, abriu mão da estrutura em troca da comissão de Relações Exteriores.
Nesta terça, os deputados do PSC decidiram chancelar a indicação de Feliciano para o posto. Por isso, ele era candidato único na eleição desta quarta.
“Penso que a candidatura posta está contra a função precípua da comissão, posto que o pastor, que tem a candidatura posta, tem declarações inequivocamente preconceituosas e racistas”, afirmou a deputada Erika Kokay (PT-DF).
O líder do PSOL, deputado Ivan Valente (SP), afirmou que a comissão não teria condições políticas de funcionar caso Feliciano fosse eleito. “Essa comissão trata de questões sobre direitos inalienáveis. Luta contra o preconceito, contra o racismo. A comissão precisa ter alguém que represente esses valores. A manutenção do nome do deputado Feliciano é uma radicalização inaceitável”, discursou.
Na tentativa de inviabilizar a votação, os manifestantes que assistiam a sessão as intervenções dos parlamentares a cada momento com aplausos e vaias.
Opositores de Feliciano chegaram a sugerir que a deputada Antônia Lúcia (PSC-AC) registrasse uma candidatura avulsa, no entanto, diante da pressão da liderança do PSC, ela anunciou que não poderia se contrapor à decisão do partido. O líder da sigla, inclusive, levantou-se para pedir que a deputada anunciasse no microfone que não seria candidata.
“Me sinto publicamente humilhada pelo meu partido. Os deputados resolveram me escolher como alternativa sem combinar comigo e o meu partido se opôs. Acho que é machismo. Vou ver agora o que aconteceu”, afirmou Antônio Lúcia ao G1 ao deixar a comissão.
O anúncio de que não se candidataria à presidência do colegiado provocou nova gritaria na comissão e protestos dos manifestantes. Vários deputados sugeriram a suspensão da reunião. Diante do clima de protestos, o deputado Domingos Dutra decidiu cancelar a sessão, sem remarcar nova reunião para a escolha do presidente.
“Pela credibilidade do Parlamento, eu vou suspender a sessão”, afirmou.
O presidente da comissão precisa ser escolhido por 10 dos 18 membros da comissão. Parlamentares contrários à indicação tinham planejado se abster de votar para que Feliciano não obtivesse 10 votos.

Novos protestos

Os manifestantes afirmaram que voltarão a realizar protestos caso o nome de Feliciano seja mantido. “A nossa crítica não é só ao parlamentar, que é um pastor com posições homofóbicas, racistas, contrárias à pauta de Direitos Humanos. Mas também a toda plataforma desse partido”, afirmou a cientista política Kauara Rodrigues, que também é assessora técnica do Cfemea, organização não-governamental que luta pelo direito das mulheres.
O deputado Jean Wyllys (Psol-RJ) afirmou que uma estratégia do partido é esvaziar a sessão para que Feliciano não consiga 10 votos.

“Sou radicalmente contra, não voto nele, fiz a articulação com os deputados pra que a gente esvaziasse a comissão pra ele não ter maioria, pra não legitimar a eleição dele. E minha questão não é pessoal. É política. Não é pelo fato dele ser pastor. Se ele fosse um pastor identificado com a luta das minorias, eu não faria oposição. O problema não está no cristianismo, nem dele ser pastor. Mas no fato dele ser racista, homofóbico e contrário aos direitos das minorias”, afirmou o deputado.

Nathalia Passarinho e Fabiano Costa
Do G1, em Brasília

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